Helton Elias | Resenha Descritiva sobre a Edificação Gráfica da Moçambicanidade em “Xicandarinha” de Calane da Silva



Resenha Descritiva sobre a Edificação Gráfica da Moçambicanidade em “Xicandarinha” de Calane da Silva 

 

Helton Elias




SILVA, Calane da. Xicandarinha. Alcance Editores, Maputo, 2010.  


Índice

Resenha Descritiva sobre a Edificação Gráfica da Moçambicanidade em “Xicandarinha” de Calane da Silva  2

Apresentação do Autor 2

Perspectivas Teóricas da Obra. 3

Breve Resumo da Obra. 4

Principais Teses Desenvolvidas na Obra. 5

Resenha Descritiva. 6

Conclusão. 13

 


 

1.      Resenha Descritiva sobre a Edificação Gráfica da Moçambicanidade em “Xicandarinha” de Calane da Silva

1.1. Apresentação do Autor

            De seu nome completo Raul Alves Calane da Silva. Nasceu em Lourenço Marques (actual Maputo) a 20 de Outubro de 1945. Foi jornalista profissional durante mais de 20 anos. Enveredou por uma carreira académica a partir de 1993. É professor de Literaturas Africanas de Língua Portuguesa e de Didáctica da Literatura na Universidade Pedagógica de Maputo. É fundador e dirigente das seguintes Associações: ONJ (Organização Nacional dos Jornalistas); AEMO (Associação dos Escritores Moçambicanos); AMOLP (Associação Moçambicana da Língua Portuguesa); É membro e fundador da AILP (Associação Internacional da Língua Portuguesa). Tem uma vasta obra literária e académica já publicada:

Literárias:

Ø  Dos Meninos da Malanga (Poesia);

Ø  Xicandarinha na Lenha do Mundo (contos – obra obrigatória para os alunos da 9ª. classe do ensino secundário);

Ø  Lírica do Imponderável (poesia);

Ø  Gotas de Sol – A Manifestação da Palavra (obra em verso, prosa e contos – agraciada com o Prémio da Cidade de Maputo – 10 de Novembro);

Ø  Nyembête ou as Cores da Lágrima (romance);

Ø  Vera Cruz: Poema – Alma de uma Peregrinação Incompleta (poesia e prosa poética);

Ø  Pomar e Machamba de Palavras (literatura infantil);

Ø  João à Procura da Palavra Poesia (literatura infantil).

Académicas:

Ø  Gil Vicente: Folgazão Racista? (ensaio);

Ø  O Estilo Craveirinha (Investigação linguístico-Literária);

Ø  Tão Bem Palavra (Investigação Linguística)

Ø  A Escrita de Anton (compilação com base na obra de António Carneiro Gonçalves)

Ø  Ao Matabicho (Compilação e Estudo introdutório feito com António Sopa);

Ø  Kulimar (Manual didáctico).

1.2. Perspectivas Teóricas da Obra

A obra “Xicandarinha” de Calane da Silva é um binómio literário, uma vez que apresenta duas marcas de períodos literários diferentes.

Dum lado, a obra é feita com base às temáticas de colonização: onde a imagem do negro é do empregado, sem um tecto digno, residente em casas de caniço e zinco, de casa cujo quintal é de madeira ou chapas de zinco.

O ambiente vigorante nessa parte é de etnocentrismo, ou seja, a valorização da cultura portuguesa em detrimento da nacional. E isso, não é descrito de forma clarividente, pois seria difícil ao autor textual, incutir nas personagens marcas das crenças, dos hábitos, da religião e outros elementos da cultura num sistema da aculturação. A ser assim, opta por fazer da língua objecto cultural e, mostra isso através de alguns contos como: “Falar bem é bom?”. Não obstante, encontra-se uma “língua superior” e outra “fraca” ou “baixa”, sendo a primeira a língua portuguesa e outra de origem bantu – ronga –.

Doutro lado, encontra-se patente a independência temática, ou seja, como se disse indirectamente nos dois parágrafos anteriores, havia uma prisão do ponto de vista da posição assumida pelas personagens autóctones de Moçambique; entretanto, houve a necessidade de se quebrar esse jugo literário, passando-se a tratar de temáticas relativas aos desejos e aos sonhos.

1.3. Breve Resumo da Obra

Na primeira parte da obra, tem-se o conto “Xicandarinha”, que conta com cinco personagens: Tio Dinasse, Mamã, Papá Silva, a vizinha dona Lucinda, os filhos: Rabeca e Carlitos.

Tudo começa quando o mineiro, Tio Dinasse, que voltara da África do Sul com um presente: a chaleira, a qual deu à família da sua irmã, ou seja, à mãe de Rabeca e de Carlitos. Assim, essa dádiva era uma lembrança do serviço prestado no Transval, visto que jamais voltaria às minas por motivos de saúde.

O segundo conto: Lume da Vida, é a continuação do primeiro atrás resumido. Contudo, nessa história as personagens acrescentam-se, tendo-se Guida e Eduardo que são irmãos de Rebeca e de Carlitos, e tia Cecília. Desta feita, a chaleira aqui é posta à prova, e em simultâneo, os filhos e a esposa de Silva preparam o chá, em contrapartida o chefe da família volta do hospital quando o tio Dinasse fora.

No terceiro conto, que também é o contínuo dos dois anteriores, faz perceber que o presente de tio Dinasse era, concomitantemente um “dilema” para os que lavavam-na, pois os filhos eram mandados a o fazer (o acto de lavar) de tal forma que a chaleira permaneça limpidíssima como viera.

Já o quarto conto, marca-se coincidentemente pela morte de Silva e de Boby (o cão). Sendo assim, essas mortes trouxeram consigo algumas mudanças, ou seja, essa família teve que se mudar para uma outra casa, a de tia Gumende, que interesseiramente sugeriu a mãe de Guida para que assim o fizesse.

Os restantes contos dessa primeira parte vão se caracterizar por esses problemas típicos moçambicanos.

Nessa onda, a segunda parte começa com o conto Lenha do Mundo (consolidando-se com os subsequentes), que gira entorno de personagens de identidade indefinida, bipolar e discriminativa. Assim, essa história acontece graças ao João que tinha dois filhos: Artur e João. Nessa vertente, sugere-se aos problemas havidos após a proclamação da independência.

Observa-se que os contos presentes, sugerem ao contexto histórico colonial na primeira parte da obra pelas suas referências temáticas e, em simultâneo, ao contexto histórico pós-independente isso já na segunda parte pelas mesmas razões retro.

1.4. Principais Teses Desenvolvidas na Obra

            Quando fala-se de tese, aponta-se a proposição que se apresenta ou expõe para ser defendida em caso de impugnação. Na obra podemos encontrar a seguinte: a edificação gráfica de moçambicanidade, que se regista por conta dos seguintes aspectos: neologismos, empréstimos linguísticos (directo e indirectos), hibridização linguística e oralidade.

            Os elementos acima referenciados dão luz às seguintes teses em forma interrogativa: “ser ou não ser moçambicano?”, “a cultura europeia é melhor ou não que a moçambicana?”, e “o que será dos moçambicanos após a independência?, ou seja, o que os moçambicanos esperam do amanhã?”

            A primeira tese, “ser ou não ser moçambicano?”, vai se caracterizar pela metáfora dos modos-viventes moçambicanos dos portugueses, todavia notar-se-á que a portuguesa vai superar a outra.

            A segunda tese, “a cultura europeia é melhor ou não que a moçambicana?, sugere uma reflexão autónoma do leitor, pois ao contrário da primeira, o autor textual aqui não dá primazia à uma em detrimento da outra através das personagens.

            Por fim, a última tese que denomina-se: “o que será dos moçambicanos após a independência”, representa em primeira instância, a dificuldade de se ter uma identidade, uma vez que acaba-se por se sair duma colonização; na segunda instância, focaliza o conjunto de sonhos, desejos e metas futuros que os indivíduos moçambicanos, que por anos foram colonizados traçam e desafiam-se.


 

1.5. Resenha Descritiva

O termo Moçambicanidade tem sido muito debatido ultimamente, por várias razões relativas à génese e à metamorfose da literatura moçambicana, desde aos tempos da cópia, da imitação e do plágio de modelos aportuguesados até aos tempos de ruptura desses. Desta feita, a literatura obedece a literariedade, sendo assim, os escritores moçambicanos têm vários elementos para criar uma identidade cultural-literária: a oralidade, a inserção de palavras de línguas bantu no vocabulário da língua portuguesa, a criação de neologismo com base nessas línguas bantu, a própria manifestação cultural na vertente temática nos subsistemas da superstição, da feitiçaria, entre outros elementos.

A primeira parte de “Xicandarinha”, contém nove contos: Xicandarinha, Lume da Vida, Cinzas da Areia, Fumígero Pássaro Metálico, Rodopiando no Grande Combate, Ósculos de Ferro e Fogo, A Grande Água Devorada, A Árvore, Rosa Mademónio, Stefana e Khombo, Olhos em Khomo, Fúria Amorosa, As Feridas da Paixão, A Bandeira de Xilephana, O Corpo como Arma, Falar bem é bom?, Morte Lenta em Minkhokweni e Mastro da Morte e da Vida.

A Segunda, conta com onze contos: Lenha do Mundo, João sem Paz, Vovó Tiko, Lume no Coração, Vovó Tiko, Poeta da Terra, Vovó Tiko, Hi Dlhaí!, Afinal Sathâna é uma Criança?, Para quando os Homens Forem Novamente Deuses e Mundo Novo.

            No primeiro conto (como nos outros que ver-se-ão), a Edificação da Moçambicanidade é possível através de frases e palavras de língua bantu;

Hoyo Hoyo Makwêju! [1]– Frase exclamativa que significa: “Sê bem-vindo irmão!”

            Ximatâna[2] – bebida feita com levedura de cerveja, bocados de pão (as vezes), água e açúcar. Bebida fermentada tipo cerveja que se vendia nos subúrbios da capital e era consumida principalmente.

            Xicalabiça[3] – bebida tradicional do tipo uputso mas mais alcoólica. É feita à base de farinha de milho, meixoeira e açúcar.

            As duas bebidas acima mencionadas, são marcas de identidade moçambicana, uma vez que dizem respeito ao que é nacional, sem algum interveniente da diáspora. Ao contrário, seria falta ou ausência de moçambicanidade se o autor se referenciasse ao Vinho do Porto, por exemplo.

            Esse conto termina com a desvalorização da língua bantu (ronga), na página 16, pelas próprias personagens, no decurso de um diálogo entre mãe e filho:

“– Esta Xicandarinha não vou conseguir levar mamã! – dizia o Carlitos.

– Xicandarinha não! Chaleira, meu burro – Ripostava a mamã que (…).”

            No segundo conto, Lume da Vida, além da inserção de palavras de origem ronga no português, tem-se a hibridação linguística que visa, consoante o contexto que propõe-se aqui, em conjugar verbos de ronga sob a norma portuguesa de verbos da primeira conjugação: patlhar[4]. Contudo, prevalece o carácter de menção às bebidas moçambicanas: ucanhi[5] e de árvores locais xilati[6].

            Quanto aos espaços físicos, tem-se Catembe, Bela Vista, Guachene e Alto-Maé, que vão adensar o enredo, fazendo com que o leitor moçambicano se sinta mais a par dos acontecimentos. Não obstante, constituem os espaços atrás mencionados, parte do património cultural, pois é onde reside parte da sua história.

            Dentro do terceiro conto, Cinza e Areia, apenas a expressão ma’pachão[7]((foguetes) é que alicerça o posicionamento de que a inserção de palavras de origem bantu, no caso ronga, é contínua.

            À semelhança dos contos retros, o quarto: Fumígero Pássaro Metálico, conta com duas palavras de origem bantu: xicalabiça (que atrás se traduziu) e xidjumba[8] (trouxa).

            Quanto ao Rodopiando no Grande Combate, quarto conto, tem-se duas expressões e palavras novas de origem bantu: Mu’cinco! (corresponde no texto a uma lata de cinco escudos), Mu’dois! Kwana Mwanu![9], (pequeno pote de barro. Cada um destes pequenos potes de xicalabiça eram vendidos a um escudo) e Há I kine Juliô![10] (Vamos dançar Júlia); xipefos[11] (candeeiro a petróleo feito a partir de uma lata onde se fura a tampa para o pavio), mabandido[12] (muitos bandidos) e marrabenta[13] (uma das danças e género musical de Moçambique). Assim, nota-se o escritor tenta fazer o conto mais adequado ao contexto moçambicano, através do cravar da dança e da música deste mesmo país, sabe-se também que a cultura engloba tanto estes e outros aspectos, como a religião e a língua; portanto, é o afirmar da identidade cultural moçambicana.

Ósculos de Ferro e Fogo, é o quinto conto, que contém além de empréstimo directo do inglês: stress[14], algumas palavras de ronga: nhangas[15] (curandeiro), mulala[16] (raiz de arbusto com o qual se lava os dentes, tendo propriedades desinfectantes) e madjumba[17] (ritmo musical de Moçambique) e por fim, tem-se um neologismo: futeboladas[18]. Logo, há um trabalho feito pelo autor textual com pretensão de fazer sentir-se a essência de moçambicanidade nas suas diversas vertentes, tanto ao nível social tanto ao religioso.

            Relativamente ao sexto conto, A Grande Água Devoradora, há ocorrência de interjeições ronganizadas (interjeições com base originária da língua bantu ronga) que estão além do português padrão: Nhandayeyôôôô…! Nhandayeyôôôô…![19], que inversamente equivale ao “Socorrooo…!”. Ajuntando, há doutro lado a nomenclatura espacial moçambicana: Malanga[20], Minkhokweni [21].

            Na mesma óptica acima referenciada, A Árvore, é o quinto conto que não só apresenta as interjeições ronganizadas, como também palavras de ronga: xiguila[22] (uma vara com um maço numa das pontas; arma de defesa e ataque), chindjinguiritana[23] (pássaro pequeno), gala-maluco[24] (árvore tipo mandioqueira gigante, cujos frutos, pequenos em cápsula, quando secos tem sementes saborosas, só que venenosas), mapswele[25] (senhora abastada que tem vários servos), bula-bula (originário do verbo ku vula-vula – falar, mas falar mexeriqueiro), gogogo[26] (lata de petróleo de 20 litros com qual se ia buscar água), xiticulumucumba[27] (fantasma, alma do outro mundo) nhamussoro[28] (adivinho simultaneamente curandeiro e feiticeiro), madala[29] (adultos mais sábios); como também faz menção à bebida moçambicana: tontonto[30] (bebida alcoólica tipo aguardente feita a partir de cana de açúcar). Em paralelo, acontece a hibridação linguística, onde consequentemente nasce o verbo: fembar[31] (amálgama de ku femba – de ronga, que significa exorcizar, tentar afastar os espíritos; e de adopção das normas dos verbos da primeira conjugação do português, ou seja, com a terminação –ar). Assim, ocorrem expressões interjectivas e ronganizadas: Sukani! Fambani kaia! (Saiam daqui! Idem à casa!), e novamente massinguita.

O nono conto, Rosa Mademónio, apresenta uma expressão frásica que prevalece o casamento entre duas línguas, a ronga e a portuguesa: matchimba dos mabaquite![32] (cagada dos baldes). Ora, na expressão nota a preposição “de” que se encontra contraída com o artigo “o” – plural, masculino –. Fora a isso, tem-se a mesma estratégia das histórias anteriores: Hi mademónio, va muloíle[33](é um demónio, endemoninharam-na), n’goma[34] (relativo aos espíritos, ao exorcismo, à adivinhação), xicuembo[35] (espírito, feitiço), xa hila[36] (é proibido).

Stefana e Khombo, é a décima história que tem nomenclaturalmente uma das personagens principais em ronga: Khombo[37] (desgraça). E, como forma de equilibrar a pretensão de moçambicanidade, espalha as seguintes palavras de ronga dentro duma canção: mulala[38] (raiz de um arbusto com o qual se lava os dentes), kunheta[39] (fazer umbigadas durante a dança),

O décimo primeiro conto, Olhos em Khombo, apenas vai trazer de novo uma palavra do ronga: bangui[40] (droga tipo marijuana, cannabis sativa), contudo o conto seguinte, Fúria Amorosa, nenhuma. Em contrapartida o décimo terceiro, As feridas da Paixão, contraria o anterior apresentando: xipoco[41] (fantasma).

De novo o décimo segundo conto, A Bandeira de Xilephafana, vai trazer o que aqui se denomina de personagens ronganizadas, como na décima história sucede, tem-se: Xilephafana[42] (barba, ou barbicha), xilunguíne[43] (lugar onde vivem os brancos), mufana[44] (miúdo),

Do décimo terceiro até ao décimo oitavo contos que abarcam-se: O Corpo Como Arma, Falar bem é bom?, Morte Lenta de Minkhokweni, e Mastro da Morte e da Vida; apresentam a afeição nominal dos espaços, pratos, comidas e bebidas de Moçambique, contudo na língua ronga: xibazaranine[45] (pequeno bazar), a gastronomia, a moçambicanidade gráfica aponta várias expressões, nomeadamente: mundlhé[46] (camarão muito pequeno, seco), nhangana[47] (comida tradicional feita à base de folhas de feijão “timbawene” e amendoim) e babalaze[48] (lazeira). Em contrapartida, excluem-se nesse trabalho todas formas em bantu, que não trazem a moçambicanidade (gráfica), conforme a definição descrita no início capitular.

A segunda parte da obra, Lenha do Mundo, contém vários contos que não estudaremos de forma isolada, visto que são dependentes umas das outras. A ser assim, tem-se apenas duas palavras do léxico-bantu-ronga: Tiko[49] (país, território. No texto representa o nome da avó) e kululeku[50] (independência).

 

Aliado aos primeiros contos dessa segunda parte, Hi Dlahi é o oitavo conto, que apresenta a moçambicanidade graficamente em uma expressão e em um nome: Hi Dlahi (mata-nos)[51] e mamba[52] (cobra muito venenosa), respectivamente.

Outro conto que é interessante à temática é o nono conto, Afinal Sahtâna é uma criança?, pois edifica a moçambicanidade da seguinte forma: Sahtâna[53] (diabo), micaia[54] (árvore muito espinhosa), mamana waminôôô! [55](minha mãe), ni pfunêni minôôô[56] (ajudem-me!), missava[57] (areia, terra).

Nessa ordem de ideias, nota-se um certo cepticismo gráfico respeitante à moçambicanidade por parte do autor, nos últimos dois contos: Para quando os Homens Forem Novamente Deuses e Mundo Novo, pela ausência sublime de marcas de moçambicanidade.


 

1.6. Indicações

A obra é bastante didáctica, contendo variedade de conteúdos que se alicerçaram no contexto do ensino e aprendizagem da língua portuguesa. Contudo, as expressões em língua bantu, podem contrastar a realidade gráfica de ronga, ou seja, não houve a padronização ou a consulta à grafia correcta delas.

Sabe-se que o ensino-aprendizagem da língua portuguesa, geralmente baseia-se em textos, existem na obra diversos contos em que aspectos referentes às relações semânticas, à criação de novas palavras, à siglação, à acronímia, ao truncamento, ao nome predicativo do sujeito, entre outros semblantes gramaticais podem ser abordados. 

Quanto ao juízo temático, a obra é bastante rica, uma vez que privilegia a nomenclatura de personagens à moda moçambicana, a descrição de eventos à moda cultural de Moçambique, os espaços dicotomicamente físicos moçambicanos e os psicológicos portugueses, a menção de pratos típicos moçambicanos. Em outras palavras, a obra é um exemplo de identidade gráfica de moçambicanidade.

Sugere-se a obra a todos leitores moçambicanos e não só, pois constitui uma ponte entre o antes e o depois literário moçambicano. Nessas linhas, pressupõe-se que quem quiser entender a cultura moçambicana, é indispensável a aquisição dessa obra.

Para a comunidade académica, em particular os enfocados na linguística, a obra é interessante pois o autor textual exige a padronização da língua bantu – ronga –  e, portanto, fecunda quando demostra que a língua portuguesa em Moçambique é indissociável das línguas de origem bantu.

Conclusão

Em jeito conclusivo, as abordagens Silvianas nessa obra constituem a edificação gráfica da moçambicanidade, como forma de revelar o que pertence à nação moçambicana. Nessas entrelinhas, encontra-se na linguística: a hibridização de ronga e portuguesa e, o seu respectivo casamento; na gastronomia: a apresentação dos alimentos, das bebidas e das plantas moçambicanos; na medicina: há comparação da medicina moderna e tradicional (pertencente a Moçambique); na cultura: os modos-viventes são postos em metáforas constantes com os europeus.

Volta-se ao fenómeno fulcral, a parte linguística, é característica da obra a prevalência de duas línguas intercalando-se constantemente na obra, embora a bantu seja “objecto decorativo” da portuguesa. Essa “decoração” efectiva-se intermediamente por: neologismos, siglação, empréstimos linguísticos (directo e indirecto), hibridização linguística e oralidade.

A obra semelhantemente à Xigubo, ajuda a todos que querem apreender o português-ronganizado, ou seja, ajuda a perceber a ocorrência do ronga no português.

Nessa senda, lamenta-se o facto de obra representar culturalmente uma parte de moçambicanos, visto que a língua bantu (ronga), é apenas falada por um pedaço sulista do país. Dessa forma, enquanto de lado é, a obra, exuberantemente enaltecedora da moçambicanidade gráfica; por outro lado, Xicandarinha, é uma marca viva de exclusão linguística.

Apoiando-se ao posicionamento acima, sugere-se à inclusão de línguas nortenhas e centristas de Moçambique, como forma mista da moçambicanidade gráfica. Embora essa fusão seja difícil e extramente árdua, desafia-se à essa estratégia; pois vários leitores sentem-se excluídos (como antes se disse) do contemporâneo mundo literário moçambicano. 

Helton Elias (2020) 


[1] Página 14.

[2] Página 15.

[3] Idem.

[4] Página 16.

[5] Idem.

[6] Página 17.

[7] Página 18.

[8] Página 20.

[9] Página 20.

[10] Página 21.

[11] Idem.

[12] Página 22.

[13] Idem.

[14] Idem.

[15] Página 23.

[16] Idem.

[17] Página 24.

[18] Página 23.

[19] Página 26.

[20] Idem.

[21] Página 27.

[22] Página 32.

[23] Página 33.

[24] Página 33.

[25] Página 32.

[26] Página 34.

[27] Idem.

[28] Página 35.

[29] Idem.

[30] Página 31.

[31] Página 35.

[32] Página 40.

[33] Idem.

[34] Idem.

[35] Idem.

[36] Idem.

[37] Página 43.

[38] Página 45.

[39] Idem.

[40] Página 47.

[41] Página 52.

[42] Página 54.

[43] Página 58.

[44] Idem.

[45] Página 59.

[46] Página 60.

[47] Idem.

[48] Idem.

[49] Página 72.

[50] Página 73.

[51] Página 82.

[52] Página 85.

[53] Página 88.

[54] Página 89.

[55] Idem.

[56] Idem.

[57] Idem.

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